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11 de September de 2020

EXTENSÃO DA LIBERDADE PROFISSIONAL NA VISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Diz o artigo 5º, XIII da Constituição Federal ser livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações que a lei estabelecer. A liberdade individual apontada no texto reforça a ideia de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude de lei, aqui compreendida a lei como qualquer uma daquelas espécies normativas elencadas no artigo 59 do Texto Constitucional.

Nossa Carta Política, de conteúdo principiológico e programático, aspira a que a ordem constitucional deva dizer e promover aquilo que consideramos ser interessante para o bem comum. O exercício de qualquer atividade é saudável, se considerar que todos têm direito à própria subsistência. Nos aproximamos, portanto, de um estado social com direitos e liberdades identificados em suas normas.

Porém, é preciso considerar que certas liberdades poderão e deverão ser fiscalizadas e controladas pelo Estado, sobretudo pelo risco social que implementam. Não há liberdades ou direitos absolutos.

Em recente decisão, na arguição de descumprimento de preceito fundamental – ADPF nº131, o Supremo Tribunal Federal, ao interpretar o artigo 5º, XIII e avaliar a extensão de sua aplicabilidade, entendeu que a liberdade profissional apontada no dispositivo reserva ao legislador infraconstitucional a regulamentação de algumas profissões.

Em seu voto, enquanto relator da ADPF nº 131, o ministro Gilmar Mendes entendeu que o dispositivo sob exame encerra em si o que ele denomina de reserva legal qualificada. Para o ministro, algumas profissões clamam de regulamentação e controle justamente pelo risco que implementam à sociedade, se não forem monitoradas. Assim o é com o advogado, o médico, o engenheiro, o cirurgião dentista, entre outras profissões.

A discussão travada no processo constitucional pretendia ver reconhecido que os Decretos 20.931 de 1932 e 24.492 de 1934, por serem vetustos, não teriam sido recepcionados pela Constituição Federal de 1988 (art. 5º, XIII), cujo conteúdo programático clamaria por liberdade de atuação de alguns profissionais não médicos na realização de exames e consultas e na indicação de óculos e lentes de grau sem receita médica.

A ametropia ou erro refrativo, cujos mais comuns são a miopia, a hipermetropia, o astigmatismo e a presbiopia são diagnósticos médicos oftalmológicos e somente esse profissional está habilitado para tanto, sob pena de se colocar a saúde visual em risco, já que algumas patologias, cuja consequência possa ensejar um erro refrativo, poderão levar a cegueira se não forem devidamente diagnosticadas e tratadas. O risco da perda da visão suplanta a liberdade de atuar de algum profissional que não tenha a capacidade de diagnosticar corretamente as patologias oculares.

Qualquer outro profissional que não detenha conhecimentos médicos, não pode realizar diagnósticos oculares, justamente porque até para dizer se se trata somente de um erro de refração o profissional não médico precisa deter conhecimentos técnicos os quais não possui.

As liberdades constitucionais revelam em si a natureza do convívio social. Exercer determinadas profissões impõe conhecimentos técnicos somente adquiridos após anos de estudos, especializações e autorização específica. Algumas áreas do conhecimento, não obstante terem pontos de similitude, não autorizam que se exerçam profissões as quais não estejam verdadeiramente habilitados. O risco social de algumas atividades não autoriza o exercício profissional sem controle.

*Artigo publicado por Valério Ribeiro na edição nº362 da Revista Em Voga.

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