Vivemos tempos estranhos de ausência de segurança jurídica, desarmonia de poderes e relativização da coisa julgada. “Abrir” os jornais e “ler” o noticiário já se tornou previsível do que de fato iremos encontrar. Todos os dias alguém diz que o estado democrático de direito está em apuros e precisamos salvá-lo, excepcionalmente com a regulamentação das redes sociais e das mídias digitais. A imprensa tradicional, por sua vez, agoniza em busca da esvaída audiência. E o que esperar nesse cenário de incerteza?
É princípio básico de direito e garantia fundamental de todo o cidadão a liberdade de manifestação do pensamento. Está escrito no artigo 5º, inciso IV da Constituição Federal. Portanto, regulamentar algo que a Constituição afirmou ser livre contraria o poder constituinte originário. Aquele que se organizou na década de 80, após o fim do regime de exceção.
Por outro lado, quando um dos poderes da república clama a regulamentação de algo e invade a competência de outro, percebemos a chamada usurpação de funções. De fato o judiciário tem a última palavra, conforme também está expresso no artigo 5º, inciso XXXV da Carta Política. Ele, o judiciário, é, em tese, o guardião da Constituição Federal. Porém, isso não lhe defere a prerrogativa de legislar e avançar sobre os assuntos que deverão ser tratados e legislados pelos demais poderes.
Ademais, vale lembrar que os direitos e garantias fundamentais, dentre eles a manifestação livre do pensamento, compõem o que chamamos de núcleo constitucional intangível. Essa expressão advém do fato de que não será objeto de emenda a proposta tendente a abolir os direitos e garantias fundamentais, conforme expresso no artigo 60, § 4º, também do Texto Constitucional.
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Todas as vezes que verificamos a tentativa de se alterar nossas garantias fundamentais precisamos perguntar qual a razão para essa iniciativa. O que temos visto, sob a falsa veste de defesa do estado democrático de direito, é um grupo político tentando usar o ativismo legal para perpetuar-se no poder relativizando, ele sim, os direitos e garantias que temos como cidadãos livres. O afastamento de juízes por decisões monocráticas sem sequer haver processo disciplinar é exemplo do que se afirma.
A democracia da dominação existe quando o motivo usado para regulamentar direitos se traveste de uma falsa legalidade, se ampara em uma falsa defesa de direitos e intenciona retirar as garantias constitucionais conquistadas a duras penas.
Artigo publicado por Valério Ribeiro na edição nº406 da Revista Em Voga.
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