Muito se discute a respeito do tema envolvendo o erro médico e seus desdobramentos no âmbito da responsabilidade civil. Especialidades como a obstetrícia, cirurgia plástica, ortopedia e oftalmologia têm sido alvo de um grande número de ações judiciais em que se discute a prática de alguma conduta que tenha trazido um resultado insatisfatório ao paciente.
Nesse sentido, a desumanização da medicina, a aceleração dos atendimentos, a má formação dos profissionais e o maior conhecimento dos direitos por parte dos cidadãos têm contribuído sobremaneira para o aumento das estatísticas e do número de processos buscando todo tipo de reparação.
Porém, é importante perceber alguns pontos relevantes dentro do tema para concluir que há uma grande diferença entre o erro, propriamente dito, e a insatisfação do paciente, conforme será demonstrado a seguir.
O termo “erro”¹ talvez não seja a melhor expressão, já que, para a caracterização do ato ilícito e o consequente dever de indenizar deverá haver a concorrência dos elementos da “culpa”, ou seja, imprudência, negligência ou imperícia. Melhor, portanto, a expressão “culpa médica”.
Além do elemento da ação culposa, para a configuração do dever de indenizar também deverá haver o dano experimentado pela vítima, ligado ao ato culposo por um nexo de causalidade. Esses são, portanto, os elementos do ato ilícito que deverão ser demonstrados em juízo para que se tenha o dever de reparar.
Nesse matiz, inicialmente parte-se do pressuposto de que a obrigação do médico, com algumas exceções, é de meio e não de resultado. Vale dizer, o médico não pode prometer a cura, mas, envidar esforços, dentro de sua especialidade, verificando de forma diligente o seu campo de atuação, sem inovar ou praticar atos sem evidência científica.
Assim agindo o profissional, certamente estará assegurado seu direito de defesa e o êxito em ações judiciais em que se discute o erro médico por ele praticado. É que sem a demonstração dos elementos acima apontados, que configuram o ato ilícito, não haverá o dever de indenizar, nos termos do art. 927 do Código Civil².
Ademais, sendo uma obrigação de meio, e não de resultado, o médico não está comprometido com a cura, mas, com a realização de atos médicos de forma a tentar restabelecer a saúde de seu paciente. Sua responsabilidade é subjetiva, conforme preceitua o art. 14, § 4º do Código de Defesa do Consumidor³.
Importante ainda destacar que o prontuário médico, muitas vezes negligenciado pelos profissionais da medicina, talvez seja o documento mais importante na elaboração de sua defesa, já que é ali que o médico relata todas as intercorrências no tratamento de seus pacientes.
Além de ser um documento que assegura ao consumidor o direito básico à correta informação, nos termos do art. 6º, III do CDC1, o prontuário descreve os procedimentos adotados pelo profissional na condução do tratamento de seu assistido.
Por fim, ainda que se considere os pontos relevantes acima apontados, certamente que a insatisfação do paciente com o resultado de seu tratamento poderá fazer com que procure um profissional em busca de algum tipo de indenização.
Caberá ao advogado, portanto, identificar de forma correta, ainda que difícil, a distinção entre a culpa médica e a insatisfação de seu cliente com o tratamento, fundamentando sua posição na identificação dos elementos caracterizadores do ato ilícito, que deverão servir de base para a propositura de qualquer demanda. Sem os elementos do ato ilícito, certamente que a pretensão do paciente de buscar uma reparação esbarrará na improcedência da demanda e no risco da sucumbência.
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¹ Responsabilidade Civil na Área da Saúde; Coordenador: Regina Beatriz Tavares da Silva; Editora Saraiva, 2007, pag. 26.
² Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
³ Art. 14, § 4º. A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.
*Artigo publicado por Valério Augusto Ribeiro na edição nº272 da Revista Em Voga – Março de 2013.
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