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20 de May de 2022

JUNTA MÉDICA OU ODONTOLÓGICA E ABUSO DE DIREITO

Resolução Normativa nº 424 da ANS dispõe sobre critérios para a realização de junta médica ou odontológica formada para dirimir divergência técnico-assistencial sobre procedimento ou evento em saúde a ser coberto pelas operadoras de planos de assistência à saúde. Em vigor há pelo menos 5 anos, referido instrumento vem servindo para corroborar, sob a falsa ideia da legalidade e qualidade assistencial, mais um abuso de direito perpetrado pelas operadoras de planos de saúde.

Ao argumento de que há excessos e pedidos estranhos ao tratamento a ser despendido no usuário, as operadoras, em algumas especialidades, transformaram as juntas médicas ou odontológicas em verdadeiro mecanismo que visa postergar, restringir ou mesmo negar por completo o atendimento assistencial. Há abuso de direito por parte das operadoras?

Insta salientar, de início, que não se admite a realização de junta médica ou odontológica nas situações de urgência ou emergência ou para procedimentos ou eventos não previstos nem no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde e nem no instrumento contratual celebrado entre as partes (operadora/usuário).

É bom lembrar que se houver junta médica ou odontológica, o prazo para a realização do procedimento, ou para a apresentação do parecer técnico conclusivo do desempatador que indica a não realização do procedimento não poderá ultrapassar os prazos de garantia de atendimento assistencial.

Ademais, sobre a cobertura de órteses e próteses ligadas aos atos cirúrgicos listados no Rol de Procedimentos e Eventos em saúde, é bom lembrar que cabe ao profissional assistente a prerrogativa de determinar as características (tipo, matéria-prima e dimensões) das órteses, das próteses e dos materiais especiais – OPME necessários à execução dos procedimentos contidos no Rol de Procedimentos e Eventos, devendo ainda justificar clinicamente a sua indicação e oferecer, pelo menos, 3 (três) marcas de produtos de fabricantes diferentes, que atendam às características especificadas.

Por outro lado, a junta médica deverá ser composta somente por médicos e a junta odontológica somente por cirurgiões-dentistas, na forma do artigo 8º da RN 424. A exceção será quando convidado pelas partes, de comum acordo, sendo certo que o desempatador deverá ter habilitação em especialidade apta à realização do procedimento solicitado, de acordo com os respectivos conselhos de classe.

Outro ponto importante, é que os profissionais sugeridos pela operadora deverão ser, preferencialmente, indicados a partir de listas previamente disponibilizadas pelos conselhos profissionais, pela competente sociedade da especialidade médica ou odontológica ou por associação médica ou odontológica de âmbito nacional, que seja reconhecida pelo respectivo Conselho.

Vale ressaltar que a junta deverá ser concluída com a elaboração de parecer técnico do desempatador, que deverá ser devidamente fundamentado. É comum ocorrer respostas prontas dos profissionais da operadora e desempatadores, não raras vezes manifestações repetidas já proferidas em outras juntas.

A RN 424 ANS ainda traz em seu bojo que a inobservância de suas regras ensejará a aplicação de sanção administrativa por descumprimento referente à adoção e utilização dos mecanismos de regulação do uso dos serviços de saúde.

Sem embargos das sanções administrativas previstas na regulação do tema, certo é que o abuso de direito na utilização desse mecanismo com nítido proposito de postergar, restringir ou mesmo negar o atendimento assistencial configura autêntico abuso de direito, podendo culminar em ações de responsabilidade civil e resultar em indenizações por danos materiais ou morais, em subsunção ao disposto nos artigos 186 e 187 do Código Civil.

 

*Artigo publicado por Valério Ribeiro na edição nº383 da Revista Em Voga.

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